Neste último artigo que escrevo em 2012, impõe-se um balanço do que nos aconteceu - o pouco de bom e o demasiado de mau - durante o ano que hoje finda.
Para além de nos terem tirado a esperança no futuro, com promessas que não se cumprem e propósitos que não se revelam, a ideologia de direita instalada no poder quis convencer-nos que os direitos conquistados são mordomias e que a maioria dos portugueses, sem qualquer usufruto palpável, passa o tempo a viver acima das suas possibilidades.
As reformas passaram a ser consideradas um luxo e o que temos que fazer é descontar e trabalhar até morrer para que alguns possam viver desafogadamente do fruto dos nossos impostos, sem descontar nem trabalhar. Basta-lhes investir nos mercados e exigir o retorno de altos juros, enquanto quem trabalhou e descontou sofre os cortes que permitem satisfazer os desígnios dessa agiotagem, e quem já não consegue trabalho subjuga-se aos apoios sociais, a que tem direito, mas que paradoxalmente promovem a exclusão social em vez de facilitarem o seu acesso e direito ao trabalho.
Mandaram-nos emigrar, depois de estarmos preparados com conhecimentos que permitiam iniciar uma retoma económica competitiva, pois sabem que falta o capital necessário que certa casta de corruptos se encarregou de transferir para os chamados “paraísos fiscais” em vez de o aplicar em investimentos reprodutivos e geradores de postos de trabalho.
Desviaram a atenção do problema da falta de investimento para a flexibilização das leis laborais como se os rendimentos do trabalho constituíssem a principal causa da incompetência e servilidade de quem, governando-se, nos tem governado, quando sabem que os custos da energia, comunicações, transportes e, sobretudo, os juros dos empréstimos são os que mais oneram uma empresa. Sabem, também, que a diminuição da disponibilidade financeira das famílias resulta na progressiva estagnação económica do País, porque quem não tem dinheiro não tem poder de compra. Sabem, ainda, que quanto menor for a massa salarial, menor serão as contribuições para a Segurança Social e a arrecadação de impostos para o Estado.
Não satisfeito, mas exultante com os resultados obtidos na venda de Portugal ao desbarato, este governo de direita, colocando a cereja sobre o bolo, aconselha veementemente os portugueses a terem cuidado com a sua saúde, não para que vivam melhor, mas para que não gastem tanto dinheiro ao erário público, como se não tivéssemos sido nós a contribuir para esse erário e sentíssemos um prazer imenso em adoecer.
Por toda esta perversidade, não nos roubaram só os rendimentos, roubaram-nos, acima de tudo, a alegria de viver, a honra de trabalhar por uma retribuição justa e a esperança no futuro. Assim, 2012 será certamente, parafraseando um dito popular, um ano “para esquecer”. Eu diria, antes, para lembrar como o pior ano da história da democracia portuguesa graças à velha aspiração da direita de ter “um presidente, um governo e uma maioria parlamentar”. Eis o resultado prático e imediato dessa aspiração da direita.
Falemos, então, do futuro. E, se foi com mágoa que falei deste passado, é com muito receio que falo desse futuro, porque o descaramento com que a direita dá o dito por não dito, é o mesmo descaramento com que nos continua a mentir com enganadoras esperanças, enquanto prossegue com o seu plano perverso e devastador de nos levar à total subserviência e dependência do exterior.
Alienados que estão os anéis, chegou a altura de nos arrancarem os dedos ou provocarem a sua rigidez por inércia. A opção será, seguramente, provocar a sua rigidez através do adormecimento insinuante, a mentira velada e a instituição do medo. É uma tática que tem resultado e nos conduziu paulatinamente à situação atual.
Com o tecido empresarial das pequenas e microempresas depauperado, e sendo este o principal motor da nossa economia e o maior gerador de emprego, está posta em causa a regular arrecadação de contribuições para a Segurança Social que assegure as nossas reformas e as prestações sociais a desempregados e pessoas mais carenciadas, bem como a arrecadação de impostos que permita a autonomia financeira do Estado e disponibilidade para o imprescindível investimento público.
Já se assiste, mas irá aumentar o apoio de avós aos netos cujos filhos perderam essa capacidade, por baixa de rendimentos e desemprego. Chegar-nos-ão, diariamente, notícias sobre população estudantil que abandona o ensino por dificuldades económicas. Uns emigrarão, outros irão engrossar o exército dos desempregados não registados.
Continuarão a aumentar as consultas psiquiátricas e os suicídios. Crescerá o descontentamento e a contestação, mas o desalento e o medo impedem a concretização contestatária, o que permitirá a persecução do plano maquiavélico da direita. Se bem que “mais vale tarde do que nunca”, neste caso, e para que não seja demasiado tarde, “antes que o mal cresça, corte-se-lhe a cabeça”.
Urge, então, a queda imediata deste governo mentiroso e gatuno. É este o meu maior desejo para que 2013 possa ser melhor que 2012.
(Publicado no jornal INCENTIVO de 31/12/2012)
Visitando o Congresso Internacional do Medo, de Carlos Drummond de Andrade, poderia estar tudo dito: “provisoriamente não cantaremos o amor, que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos, cantaremos o medo, que esteriliza os abraços”. O medo, amigo próximo da resignação. Resignação, amiga irmã da crise em que o país foi afundado. Seria assim o começo de um texto sobre o fim de 2011. Poderíamos mesmo avançar mais nuns versos do poeta – “cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas, cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte, depois morreremos de medo e sobre os nossos túmulos nascerão flores amarelas medrosas”.
O medo dos cortes, o medo das ameaças, o medo da chantagem, o medo de nos levarem muito para lá dos anéis, o medo do amanhã, o medo da falta de pão, o medo de não ter futuro. O medo.
Veio 2012. Mais cortes, mas ameaças, mais chantagem, mais de tudo. Mas não veio mais resignação. Aqueles que aceitavam a chuva, o desemprego e a injustiça, porque sozinhos, viram que a rua era enorme, muito maior do que esperavam. E houve retrocessos, se os houve. Voltou a ser crime distribuir panfletos. Diz-se que é pouco patriótico não aceitar o destino do empobrecimento, mal-agradecidos. O primeiro ministro confessa que 2012 foi o pior ano desde 1974, mas volta a mostrar uma inabalável confiança nos progressos de 2013. Cá estaremos.
O ano que está agora a terminar foi mesmo difícil. Isso partilhamos. A dúvida é sobre quem vai ter a palavra final no ano que está agora mesmo à porta. 2012 mostrou que a resignação não tem de ser o nosso destino. Mostrou que o que se julga fatal não vem de sempre e não tem de durar para sempre. Esse foi o dado mais imprevisível. Houve centenas, houve milhares, houve um milhão. Houve ruas enormes. Não é fácil encontrar boas notícias em 2012. Um ano de um governo e, para as nossas vidas, quase que rimava com eternidade. Mas aprendemos todos/as que a resignação não dura para sempre. O medo acabou? Não, não acabou. O medo nestas circunstâncias é legítimo. Mas este ano mostrou-nos que há mais mundo para além do medo. E essa é a promessa de 2013.
Artigo publicado no jornal “As Beiras” a 22 de Dezembro de 2012
Em Novembro do ano passado escrevi um artigo que começava assim:
”A 3ª GUERRA MUNDIAL
O Mundo está em guerra. É a 3ª Guerra Mundial; não nos moldes tradicionais, não com metralhadoras, granadas e canhões, corvetas e submarinos, aviões e helicópteros; nem sequer com armas químicas, a bomba atómica ou outras de destruição massiva. Não, não se trata duma guerra convencional, trata-se duma guerra em que todo o material bélico se resume num único substantivo: DINHEIRO. É uma guerra onde a causa (o dinheiro, ou a sua falta) se confunde com os meios bélicos utilizados (mercados: dinheiro; especulação financeira: dinheiro; aumento de juros: dinheiro; aumento de impostos: dinheiro; …: dinheiro).”
Uma guerra tem como objetivo subjugar alguém à vontade ou interesse de outrem e, nesta guerra que estamos a travar, sem que muitos de nós tenha consciência dela, o dinheiro confunde-se entre arma e finalidade.
Começam pela alteração dos valores, da política e dos meios de vida duma sociedade, incutindo a substituição da luta pela qualidade de vida e do bem-estar social pela ganância egoísta de ganhar dinheiro a qualquer custo; a democracia dos povos pela ditadura dos mercados; a educação, a saúde e o direito ao trabalho pela especulação bolsista, as companhias de seguros e o poder dos bancos. Pretendem, com esta inversão paradigmática, no mais curto espaço de tempo, conquistar todos os bens essenciais e fontes económicas do país.
Esta é a logística que proporciona os meios e custeia todas as despesas, a expensas das próprias vítimas, e está alicerçada na tática de dominar todos os bens de produção e sectores da economia, sabotando-a e subjugando-a ao poder político corrupto e à especulação financeira. Para isso, tratam de mentalizar as pessoas para a inevitabilidade de pagarem cada vez mais e ganharem cada vez menos.
Aproveitar a vaidade e a inveja das pessoas, enaltecendo o despesismo e fomentando os pedidos de empréstimos aos bancos faz parte do seu estratagema de guerra psicológica. Políticos, jornalistas, economistas, comentadores e realizadores constituem o exército que através dos órgãos de comunicação social, sondagens de opinião e agências de “rating” intoxicam e formatam, diariamente, a mentalidade menos avisada.
Evitam falar em despedimentos e fome; aumento de impostos; baixa de ordenados e pensões; dívidas; incumprimentos, mentiras e falsas declarações de governantes; vencimentos criminosos de gestores públicos; importações desnecessárias de bens de luxo; produtividade; agricultura; pecuária; pescas; indústria; corrupção; justiça. Preferem discutir futebol; figuras públicas da “socialite”; modelos e desfiles de moda; pequena criminalidade; controvérsias; mesas redondas; programas de culinária; telenovelas e concursos da TV. Publicitam incessantemente cotações da bolsa, lucros bancários; fazem a apologia de políticos neoliberais; presidentes de bancos; vida e obra dos mais ricos; sucesso de futebolistas; maravilhas da liberdade dos mercados.
Desviando as atenções da discussão para o supérfluo, enquanto vaticinam o principal como inevitável, conseguem, deste modo, obter o domínio político, financeiro e dos meios de produção à custa das próprias vítimas. É um plano estratégico sórdido e perverso, mas que infelizmente está a resultar.
Para além desta pérfida logística, esta maléfica engrenagem ainda obtém outras receitas criminosas a partir dos negócios mundiais da droga e da venda de armas, do apoio ao mundo do crime, da venda de influências e dos juros dos empréstimos agiotas sobre a dívida soberana dos países sob ataque.
A estratégia de conquista passa, como já referi, por se apossarem das fontes de produção e do capital financeiro; privatizar as empresas estruturais e fornecedoras de bens únicos de forma a controlar a energia, os combustíveis, transportes e comunicações, ao mesmo tempo que especulam os juros de empréstimos e estrangulam as pequenas e micro empresas; destruir toda a economia do sector primário – agricultura, pecuária e pescas – desmantelando, assim, toda a indústria subjacente; obrigar a empréstimos bancários das empresas e particulares e ao endividamento do Estado para ocorrer às situações de estagnação económica e desemprego daí decorrentes.
Finalmente, fomentar a guerra entre pobres e miseráveis, velhos e novos, empregados e desempregados, trabalhadores do sector público e do privado é a cereja sobre o bolo que irão repartir no festim que comemore a subjugação do país a este sórdido estratagema.
E, ainda, há quem dê o benefício da dúvida e espere que a nossa situação melhore antes das eleições autárquica do próximo ano!?
(Publicado no jornal INCENTIVO, 17/12/2012)
Há quatro anos, se a memória não me falha, tive o prazer de “apanhar” durante quatro semanas um dos professores que considero ter-me despertado mais interesse sobre um dado assunto. A cadeira era Inteligência Artificial e até hoje considero-o como um dos melhores professores que tive o prazer de me cruzar. Aprendi pouco, para dizer a verdade. Aprendi aquilo que quatro semanas permitem, sobre um assunto que é tão fascinante quanto denso e incógnito.
Esta introdução só faz sentido porque das poucas coisas que me lembro, mas não esquecerei, é a descrição inicial que esse professor fez sobre o que seria Inteligência Artificial. Será discutível, certamente, tendo em conta que essa descrição foi feita numa aula prática de Engenharia Informática e não num auditório ou sala de um curso de Filosofia, por exemplo. A memória permite-me resumir da seguinte maneira: o cérebro funciona por associação de factos. Acumulamos informação e relacionamos informação; criamos regras para descorrer esse processo.
Para uma qualquer pessoa, no decorrer da sua vida, as experiências que tem são diferentes. Portanto será relativamente consensual dizer que pensamos de maneira diferente, associamos a informação que recebemos dos nossos sentidos, das experiências de outras pessoas, de um qualquer filme ou música que ouvimos, eventualmente de maneira parecida, mas diferente não obstante. Relativamente a Inteligência Artificial, isto levanta a questão sobre como incorporar estas experiências computacionalmente, como descrever e incorporar sentimentos.
Aquilo que aprendi e ainda hoje discuto sobre este assunto tornou-se útil para aprender algo sobre este Governo PSD/CDS, e esta é a analogia: este Governo é um Governo de Inteligência Artificial.
Durante mais de um ano temos visto o processo de implantação de um programa repleto de medidas que evidenciam uma coisa acima de tudo: nenhuma preocupação sobre os seus efeitos na vida das pessoas. A preocupação, a lágrima no canto do olho, de qualquer pessoa afeta ao Governo a dizer publicamente que todo este esforço é em prol das pessoas, de quem estuda, de quem quer trabalhar, de quem trabalha, de quem já não tem trabalho ou de quem já trabalhou, perde qualquer validade no momento em que isso não se reflete na realidade. Portanto, essa preocupação foi e é falsa.
Vermos Aguiar-Branco, Ministro da Defesa, afirmar que o Governo está empenhado em salvar o Estado, nomeadamente o Estado Social, quando este Governo ativamente destrói esse mesmo; Pedro Mota Soares, Ministro da Segurança Social, preocupado com os números da pobreza quando as suas medidas aumentarão a sua “preocupação”; ou mesmo o honesto Álvaro Santos Pereira, dizer que o Ambiente não pode atrapalhar a indústria, diz-nos que, além da falta de coerência, este Governo não tem um pingo de sentimentos. É autista no que toca aos sentidos.
Este Governo não quer saber das pessoas que são atingidas pelas suas medidas porque a sua função é associar a informação que lhe é transmitida tendo em conta as regras da troika; não é preocupar-se com o efeito que elas têm na vida nas pessoas. Em caso de disputa, convido à comparação das declarações públicas sobre dado assunto e a sua implementação e resultados. Portanto, já que estamos numa de computadores, sabendo o que já sabemos hoje sobre o que esperar deste nada humano e muito artificial Governo, reiniciar o “sistema” já não serve. Resta às pessoas que se “sentem” e substituam este Windows por Linux. Ou melhor, que se levantem e substituam este Governo artificial por um Governo que se importe com as pessoas. E isso, só as pessoas podem fazer.
O POLVO LARANJA: |
(Texto divulgado por M C Raposo)
“À Nação nada peço e dela nada espero. A maior compensação aos sacrifícios que fiz em exercer este cargo, deu-ma o Congresso honrando-me com os seus sufrágios para primeiro cidadão da República; deu-ma também o povo com o carinhoso acolhimento e manifestações de simpatia com que sempre, em toda a parte, me acolheu e, acima de tudo, o facto ultimamente ocorrido, de me achar com minha família abandonado de todos, nos dias sangrentos da revolução, sem defesa possível, quando as multidões, inebriadas pelo triunfo, passaram aos milhares pela porta da minha habitação e não houve o mais leve desacato nem à minha pessoa nem aos meus...”
(Carta de resignação – Manoel d’Arriaga)
A 19 de Novembro passado fez um ano que foi inaugurada a Casa Manuel de Arriaga. A este nosso conterrâneo que dedicou a sua vida à luta pela Democracia e pela República, que nada pediu, nem esperou da Nação devemos nós a perpetuação da sua memória.
Após tanta peripécia, avanços e recuos, o empenho abnegado da Associação dos Antigos Alunos, promotora da petição que terá, inegavelmente, acelerado a sua concretização, bem como a imprensa local que nunca deixou cair esta pretensão, ficou-nos sempre o amargo pelo desinteresse das datas históricas e a falta de sensibilidade pela grandiosidade que representa esta Casa Memória na luta pela Democracia e pela República.
Esta efeméride passou despercebida no País e nos Açores, tendo sido referenciada com destaque apenas na comunicação social local, o que revela algum desinteresse geral pelos momentos altos do que é nosso e pode promover a nossa projeção em outras paragens, para além de constituir um ato de justiça para com Manuel de Arriaga, o primeiro Presidente da República por que tão desinteressada e abnegadamente lutou.
É certo que a Casa já está à distância dum click e que é caso único na Região, mas fica na eminência de seguir o mesmo caminho do Departamento de Oceanografia e Pescas que é mais conhecido no estrangeiro do que na própria ilha onde está implantado. Esta divulgação já não cabe apenas ao governo, é também, e, sobretudo, da nossa responsabilidade como concidadãos de tão ilustre figura, interessados e empenhados na divulgação da nossa terra e das suas potencialidades.
A Casa Manuel de Arriaga, neste seu primeiro ano de existência, apesar da insuficiente relevância que lhe emprestou quem de direito, tem sido visitada (1734 visitantes em 11 meses) e a sua fama já correu mundo. A atestar esta celebridade está a sua nomeação, entre outros dois finalistas, para um galardão nacional, o prémio de Museu do Ano da Associação Portuguesa de Museologia.
No discurso de inauguração, o então Presidente Carlos César reafirmou que os terrenos anexos também são parte integrante do projeto global, estando, assim, prevista a recuperação da zona de horta, pomar e jardim. Lembro-me de ter, então, publicado um artigo intitulado “Mais vale tarde que nunca”, onde referi, a terminar, que não gostaria de escrever outro com o título “Tarde e a más horas”, mas fá-lo-ei se necessário for.
Quero aproveitar esta oportunidade para relembrar, ao atual governo, o citado discurso de Carlos César, esperando que o Plano do XI Governo Regional para 2013 preveja, devidamente orçamentada, a verba suficiente para fazer face ao prometido.
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