Segunda-feira, 1 de Agosto de 2011
O capitalismo é a antecâmara do fascismo

Hoje, as nações têm uma autonomia muito menor do que antes, sobretudo se pequenas e pobres, com regimes pseudo democráticos, patronatos cúpidos e incapazes, além de governantes politica e materialmente corruptos.

Países pequenos como Portugal, há várias décadas num ciclo de progressiva inserção numa rede alargada de estados, onde a decisão está longe, dentro de um triângulo Londres-Berlim-Milão, não têm dimensão humana e política para se livrarem, isolados, do aperto do capital financeiro e da “troika”. E, não tendo dimensão, dificilmente têm capacidade.

Essa pressão externa é gerida, intra-muros, pela promiscuidade existente entre os partidos do arco do poder, neste momento chefiada por Cavaco Silva e Passos Coelho, e reencaminhada para incidir sobre a multidão, procurando garantir as condições de sobrevivência para um capitalismo obsoleto e subsidiodependente; embora se saiba que há sectores, como o da construção civil, sobredimensionados pela política de crédito fácil levada a cabo pelos bancos durante muitos anos que terão de encolher e bastante.

Dentro do cenário português há, pois, uma luta entre um patronato dinástico e bem instalado que tenta passar as suas dificuldades para o mundo do trabalho e quem procura resistir, como pode, a esse assalto.

É óbvio, que essa resistência poderá ser muito maior do que a actual que se fica pelo barafustar sem objectividade. Se passar a vias de facto, como tem acontecido em Espanha e na Grécia, poderá ser susceptível, até, de arrancar da sua letargia, muitos dos instalados à sombra da frondosa árvore duma chamada esquerda (PS) e de sindicatos domesticados como os da UGT.

A insistência na tecla patriótica implica que nós, trabalhadores, precários, desempregados, pensionistas, empresários honestos e sensatos, enfim, os explorados e todos os que vivem com dificuldade, temos de nos unir aos capitalistas lusos contra os banqueiros anónimos que tanto podem ser alemães, como americanos ou portugueses. E, unidinhos aos nossos compatriotas capitalistas que sempre nos exploraram, será que garantimos que eles não nos despedem? Que não se vão furtar à entrega de parte do produto do nosso trabalho à segurança social que paga a reforma dos nossos pais?

E temos a certeza que vão vender os carros de topo de gama para que o IVA não suba nos medicamentos e bens essenciais que consumimos? E irão investir aqui o que acumularam em “off-shores”, para criar postos de trabalho ou irão antes, continuar a preferir utilizar esse dinheiro na especulação que, até, será contra os interesses do Estado português que os abastece com os fundos da UE. Quem paga os estragos disto?

Custa a acreditar nestes exemplos? No entanto, é esse o conteúdo escondido na lógica dos sacrifícios para “todos”, do “temos que produzir mais”, da ladainha patriótica, da não inclusão de Portugal, no destino comum da Grécia, da Irlanda e dos que se lhes seguirão; é um discurso subliminar de dividir para reinar.

Na realidade, produzir mais, hoje, não é à custa de mais emprego, mas do aumento de horas de trabalho, sobretudo não pago, para quem ainda o tem. Falar de aumento da produção “nacional”, hoje, sem alteração da correlação de forças entre o trabalho e o capital é a aposta no modelo social e no paradigma económico que conduziu parte substancial dos humanos ao desastre actual. É uma proposta conservadora, de perpetuação do capitalismo, da revitalização da especulação financeira. É uma proposta que oculta que o mesmo Estado que impõe cortes nos salários e subsídio de natal, que vai promover um mais fácil despedimento, que reduz as deduções no IRS e aumenta os impostos, garante, no primeiro minuto após o corte do “rating” a bancos portugueses, apoiá-los, ajudá-los e financiá-los.

É trágico demais para ser cómico. Alimenta o estado de passividade da multidão em geral e evidencia as enormes responsabilidades de certa esquerda “paralamentar” que se arvora em condutora omnisciente das massas populares no projecto de refascização em curso.

Quando uma empresa ou um negócio tem dificuldades financeiras, os seus proprietários têm na sua frente várias opções: encerram-na, capitalizam-na com fundos próprios ou alheios ou, simplesmente vendem-na pelo melhor preço. Quando se trata de um banco, as relações de subordinação dos governantes aos banqueiros transferem o problema para o Estado e, numa carambola, a tacada cai em cima de quem vive do seu trabalho e é absolutamente alheio às dificuldades dos usurários. O Governo faz, então, o papel de agente da excepção que transforma as dificuldades dos banqueiros num problema “nacional”. Foi isso que aconteceu com o BPN, no qual a intervenção do Estado, afastou de responsabilidades os pouco recomendáveis donos da SLN e, agora, premeia um com alto cargo na Administração da CGD. Afinal, até parece que o crime compensa.

Essa intervenção é mesmo o espelho dos políticos portugueses do arco da governação e do seu comportamento criminoso. A nacionalização foi feita para não prejudicar todo o sistema bancário luso, como foi afirmado pelo governo de Sócrates - por ordem dos principais banqueiros, acrescento eu. Com ar pungente terão referido a necessidade de evitar o desemprego de muitos trabalhadores. Depois de lá estarem enterrados 4.500M€ do erário público, o governo reza para que um banco angolano, ou uma instituição mutualista, se digne dar uma esmola de 70.6M€ pelo BPN. E para cúmulo, a célebre Moody’s qualifica como lixo vários bancos lusitanos, decerto não por contágio da objectiva falência do BPN, conhecida há três anos, mas por insuficiências próprias porque, em vez de se capitalizarem com os lucros obtidos, distribuíram chorudos dividendos aos seus especulativos accionistas.

E tudo isto no mesmo momento em que um burocrata neoliberal, com “chapéu” de ministro, divulga mais um assalto ao rendimento de grande parte da população.

Aqueles cuja situação não permite pagar a prestação da casa ao banco, que têm de escolher entre os medicamentos e o prato da sopa, podem pedir a Cavaco, Passos ou Gaspar o mesmo pronto apoio financeiro do Estado? Claro que não, uma vez que eles não estão do mesmo lado, não estão numa mesma “pátria”.

Mesmo numa lógica de sacrifício colectivo, de “todos”, seria defensável que o esforço fosse proporcional ao rendimento de cada um e, portanto, incluísse uma redistribuição da riqueza, sabendo-se que Portugal tem uma sociedade das mais desiguais da Europa. Nada disso vem acontecendo, bem pelo contrário.

Beneficiando da relativa apatia social, da ineficácia de certa esquerda e de sindicatos amorfos, o capitalismo português, fiel intérprete do catecismo neoliberal, transfere os custos do desequilíbrio financeiro do Estado e dos bancos para os 95.1% da população com mais de 15 anos que não vive de juros, lucros ou rendas. Tudo isto revela que a solidariedade nacional é uma ficção e que, contrariamente às leis do mar, o capitão é o primeiro a abandonar o navio à deriva, depois de pilhar os marinheiros.

Se uns tarados mantêm armazenados em dois locais do planeta, as únicas colónias de vírus da varíola, da mesma forma, o capitalismo terá de ficar apenas nos livros de história e na memória, associado ao roubo, a sofrimentos e à guerra. Mas isso não se consegue sem esforço, sem sacrifício ou com espíritos piedosos de complacência. Basta recordar o nosso processo desde 1974 até ao presente em que o poder decisor se manteve e continua nas mesmas famílias que já nos exploravam antes do 25 de Abril.



publicado por livrecomoovento às 02:16
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